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NFANTICÍDIO INDÍGENA: JOSÉ DE ANCHIETA EM MISSÃO

Nos dias de hoje, o infanticídio ainda faz parte da cultura de muitas tribos brasileiras
Evangelho nas Selvas”, por Benedito Calixto (1893)

Conta-se que, nos idos de 1565, chegou aos ouvidos de José de Anchieta que uma das índias havia enterrado um menino recém-nascido vivo. Era filho de um prisioneiro e de uma formosa moça tamoia.
Buscou a cova por meia hora, achou, desenterrou a criança ainda com vida, lavou-a e conseguiu ao custo de muitos rogos que lhe dessem de mamar. Não viveu muito, mas morreu batizado pelo jesuíta.
Na primavera seguinte, em São Vicente, o bem-aventurado missionário desenterra outra criança. O menino nasceu saudável, mas como a mãe havia se divorciado – prática comum naquela tribo – e já tinha outro esposo, a avó paterna havia decidido que “mestiços de duas sementes são débeis”. Retirado da cova rasa, o menino não resistiu.
Em uma outra ocasião, soube do enterro de um menino que nascera deformado. A mando do pai, fora sepultado num buraco. Quando Anchieta o inumou, o recém-nascido já estava morto.
Vários missionários observaram casos semelhantes. Contudo, eram unânimes em admitir que não havia nenhum sadismo envolvido no ato. O missionário Fernão Cardim, escreveu em 1583: “os pais não têm cousa que mais amem que os filhos, e quem a seus filhos faz algum bem tem dos pais quanto quer”. Claude Abbeville, missionário francês, descreveu, em 1614, o mesmo costume entre os índios do Maranhão.
Nos dias de hoje, o infanticídio ainda faz parte da cultura de muitas tribos brasileiras. A prática mais comum é a mesma testemunhada por Anchieta: enterrar recém-nascidos vivos. Monstruoso, mas real e ocorre comumente em territórios indígenas mais isolados, sendo parte da cultura de povos tradicionais como os kamayurá, yanomami, kajabi, bororo, ticuna, uaiuai, waurá, kuikuro, entre outros.
Muitos casos em que os bebês, com menos de uma semana de nascidos, são simplesmente abandonados na mata. Deficiências físicas são o motivo mais comum para o infanticídio, mesmo quando se manifestam tardiamente – há registros de assassinatos de crianças de até 12 anos de idade.
Mas também acontece de as meninas serem mortas porque a tribo precisa de mais homens do que mulheres, ou quando ocorre do casal ter filhos em um intervalo menor que dois anos ou, ainda, quando a mãe morre no parto.

M.R. Terci é escritor e roteirista; criador de “Imperiais de Gran Abuelo” (2018), romance finalista no Prêmio Cubo de Ouro, que tem como cenário a Guerra Paraguai, e “Bairro da Cripta” (2019), ambientado na Belle Époque brasileira, ambos publicados pela Editora Pandorga.

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